Sobre o filme "Eu, robô", escrito por Isaac Asimov

É possível um algorítimo determinístico minimamente complexo retornar sempre a mesma resposta quando compilado ao infinito em face da inerente deterioração do hardware com o  tempo? Eis ai a chave para a falha dos sistemas artificiais dotados de personalidade. Mesmo um algoritmo exato pode variar devido às restrições que o mundo físico lhe impõe.

Considerando, ainda, as limitações dos processos estocásticos verificaremos que as decisões tomadas com base na probabilidade atravessam a penalização da necessidade da boa escolha dos atributos corretos, algo jamais garantido (0<p<1 :-) ). Assim, um robô impelido a escolher entre salvar um policial com probabilidade de 0,4 ou uma criança com chance de sobrevivência de 0,11 opta pelo primeiro, pois para salvar os dois a probabilidade resultante seria 0,4x0,11=0,044 ou 4,4%. Porém, um ser humano jamais faria estes cálculos no calor do momento, sendo sua reação imprevisível.

O quanto as variações das respostas padrão são importantes? Não sou biólogo e posso estar dando um exemplo falho. Mas vamos imaginar qual é a vantagem evolutiva de um indivíduo ter variações sanguíneas (por. ex. no sistema AOB ou Rh positivo ou negativo). Digamos que não haja motivo aparente para isso. Mas e se no mesmo locus gênico em que a variação sanguínea ocorre houver uma expressão que indique uma variabilidade da resposta imune a certos tipos agentes estranhos como vírus? Então uma dada população teria uma parcela dos seus indivíduos resistente e haveria sobreviventes em uma epidemia. Ou seja, uma variação sem correlação em uma característica de uma espécie pode colaborar em um outro advento.

Variações ilógicas ou dispendiosas não ocorreriam em máquinas dotadas de sistemas algorítmicos previsíveis. Me arrisco a dizer (risco sério, afinal, não sou cientista da computação) que mesmo autômatos bem elaborados recaem em algum tipo de comportamento modal, pois não existe comportamento complexo o suficiente que não possa ser mapeado e previsto. A não ser que criemos máquinas com algum grau de aleatoriedade em sua vida útil. Aí sim teríamos muitas mortes e sobrevivência dos mais adaptados. Pois não imagino uma inteligência controlando a evolução ainda mais no nível intracelular, onde teoricamente as mutações se desenvolvem.

Mesmo algoritmos dispostos a evoluir, o farão de forma potencialmente previsíveis. E isso na natureza não pode ocorrer com a lógica centrada no indivíduo. Ainda que computadores se conectem em rede para a compartilhamento das múltiplas variações do ambiente detectadas causando distorções e aleatoriedades para aumentar a variabilidade ainda serão subordinados às próprias limitações da físicas.

Se sistemas não inteligentes podem evoluir para sistemas inteligentes, então simplesmente tudo que disse não vem ao caso, afinal, estamos falando apenas de modelos. Um empregando as quatro ligações do carbono e o outro o do silício... Um usando alfabeto de quatro letras (CGAT) e outro usando o binário (01). E assim, ao criar máquinas que se repliquem com pequenas variações ao acaso e possam gerar populações que evoluam comportamento, sim, estaremos gerando vida, pois não importa o lego que você ou Deus usou.

Mas falando como criadores de máquinas subservientes, cujas leis
  • 1ª lei: Um robô não pode ferir um ser humano ou, por omissão, permitir que um ser humano sofra algum mal.
  • 2ª lei: Um robô deve obedecer as ordens que lhe sejam dadas por seres humanos, exceto nos casos em que tais ordens contrariem a Primeira Lei.
  • 3ª lei: Um robô deve proteger sua própria existência desde que tal proteção não entre em conflito com a Primeira ou a Segunda Lei.
não podem ser feridas, certamente não estaríamos falando de seres vivos, cuja limitação é apenas uma variação da terceira lei. Sendo assim, são meras máquinas, ferramentas. Perdeu a graça o assunto...

A morte do adulto e a venda da juventude

Com a invenção do modelo contemporâneo da juventude nos anos 60-70 nos defrontamos com um sedutor panorama onde todos querem ser jovens. Hoje, apenas não são as crianças em tenra idade e os velhos bem prostrados. Ou seja, em limites extremos a juventude pode iniciar aos 10-12 e terminar aos 80, p.ex.


Para deixar claro, quando digo jovem falo do modelo que envolve toda uma temática de vida em que se fazem presente pelo menos duas características que giram em torno de festas, álcool, músicas, moda, estética e eventos caracterizados como "jovens"

E o estereótipo do adulto se diluiu para os nascidos a partir da década de 60. Afinal, essa geração lutou para exercer seu direito a liberdade do deslocamento, do corpo e de opinião, sendo esta última a mais enfática, já que os jovens inerentemente não eram dotados ou não poderiam ter voz. É importante dizer que antes disso provavelmente muitos já se tornavam adultos aos 16 anos e tinham até 2/3 da expectativa de vida que temos nesse início de século XXI. O que podemos levantar do que se entendeu por adulto seria aquele que largou os sonhos juvenis de lado e passou a construir uma vida que gira em torno da manutenção da sua família e prole, sendo permitido poucos prazeres como a cachaça e o futebol. No entanto um bom pai de família adulto deveria voltar diretamente para casa depois do trabalho, sendo mal visto retornao ao lar com ares etanólicos ou odores femininos suspeitos. Melhor ainda se levar seus filhos à igreja aos domingos. Ás mulheres invariavelmente nenhum prazer era lícito.

Foi uma sociedade bastante preocupada com a opinião alheia, afinal, não se conseguiria manter anonimato em função da diminuta quantidade de vizinhos. Sendo necessário exercer uma boa aparência e mostrar bons costumes criando-se uma etiqueta postiça, vigorosamente questionada pelos jovens que a romperam. Todo formalismo deveria ser destruído, incluindo na música, com as dissonâncias do rock, vestimentas com a difusão de estampas psicodélicas, cabelos, vocabulários, etc. Ter a atitude de jovem passou a ser contrariar o comportamento passivo dos adultos. Foi o combate ao cinza dos ternos, graxa dos sapatos e sutiãs em maternos.

No entanto, estes jovens hoje tem a idade dos pais que combateram. Tem filhos e os criaram tentando ser amigos, não sendo pais "chatos". Tiveram que arrumar empregos e vender suas almas para o diabo. Muitos obtiveram sucesso ao conseguir se manter no mundo jovem que criaram. É bastante comum os alto-quarentões em boites, shows, academias, etc. Afinal, os jovens são eles. Eles lutaram contra seus pais para poderem chegar depois das 22h. As meninas fizeram sexo antes do casamento morrendo de medo de represálias sociais ou
religiosas. E as tatuagens? Conquistas com muita luta.

Porém, tudo isso ficou velho. As músicas boas, polêmicas e execráveis são clássicos. E quando queremos ir a um bom show temos que contar com os Beatles, Janis Joplin, Rolling Stones, Caetano, Chico... tudo velho.

E nós, jovens, acreditando ser o padrão, acreditando estar vendendo comportamento, na verdade estamos comprando um comportamento de "velhos". Somos conservadores desse modelo, desfrutamos da total liberdade sem questionar de onde veio e para onde vamos. Sem criar nosso próprio modelo de juventude. Mudamos apenas a roupagem tecnológica para nos sentirmos mais confortáveis. Antropofagia mal feita deste estilo de vida.

E muitos conservadores olham com desdém para esses "peles enrugadas" vestindo preto e tatuagem curtindo uma boa balada. Estes velhos estão sendo o que sempre foram, e nós taxando-os e copiando seu comportamento.

Embora o texto acima seja agressivo, eu prefiro feri-lo contradizendo o que disse. Se hoje subversão significar usar roupa social, falar gramaticalmente correto, ter um bom emprego, não sair e levar os filhos para a igreja aos domingos eu digo que é bem melhor ser conservador e seguir o modelo dos adultos-jovens. Afinal, para que questionar, não é mesmo? Prefiro abdicar de ser jovem, colocar-me a venda com uma venda.

Pores poesia - fotografias de extremos do tempo

Nos meus idos 16-17 anos fotografei diversas auroras e crepúsculos, tentei demover a poesia e enquadrá-la numa lente. Decerto intento impossível, mas restou um esboço distante do que a natureza nos reservou. Hoje, 10 anos depois ressurgiu a pergunta: o que é real? A poesia ou esses matizes do eterno devir da esfera Gaia?

Só uma coisa... o scanner não ajudou muito...





















Elo de núvem e mar - Praia Grande - SP.


A ilha que se perde - Itamaracá - PE

Sobre "Sagarana - O burrinho pedrês", João Guimarães Rosa

Um conto entremeado de imagens cujo tempo não permite postá-las linearmente numa película, vislumbrando como filme. Mais que isso, devem ser sobrepostas estáticas como transparências de um retroprojetor. Amalgamadas formam um borrão, cujo matiz espelha esse algo impressionista que força os olhos a enxergar um-não-sei-que de atávico em nossa alma cabocla.

Sim, uma narrativa de marcha sufocante, ultrassônica. Para ser lida no intervalo de tempo da espera que nunca ocorrerá. Numa gélida travessia entre sopros sistólicos de um rio sem margens. Nos instantes que intervalam dois cantos de "pássaros bonzinhos e engraçadinhos que não agouram" mas vencem crinas, chifres, chapéus e o que está abaixo. Deve ser lida entre o soluço e a lágrima de uma alminha preta.

Ironicamente, o nome do nosso ilustre protagonista, Sete-de-ouros, representa contemporaneamente para os descendentes da história a mais fraca manilha de um jogo jocoso, que mente e goza de venturas. Manilha fraca, mas acima das demais cartas por estar desavisada e sabiamente próxima da realeza. Nestes tempos de agora o chamaríamos de pica-fumo sem realizar que retinas outrora marcadas por brejos e bois tem hoje asfalto e automóveis desembestados, tudo vingado nas traquinagens da vida. Vigora ainda os mesmos espíritos movidos a cana e fole, inerências da raça humana.

Não posso negar a poesia sangrando a prosa sertaneja. Atravessando brasis e rezes, atravessando a goles e garrotes, bridas e estribeiras. Esmagando o crânio com cascos flutuantes, trespassando flancos com a compaixão de secos mugidos onde

"as ancas balançam, e as vagas de dorsos, das vacas e touros, batendo com as caudas, mugindo no meio, na massa embolada, com atritos de couros, estrados de guampas, estrondos e baques, e o berro queixoso do gado junqueira, de chifres imensos, com muita tristeza, saudades dos campos, querência dos pastos de lá do sertão. (...) Boi bem bravo, bate baixo, bota baba, boi berrando... Dansa* dôido, dá de duro, dá de dentro, dá direito... Vai, vem, volta, vem na vara, vai não volta, vai varando...".

E varando vejo a história de um grande homem, que é bem dada no resumo de um só dia de sua vida. E esse homem grande é um burro!


*transcrito conforme a 17a. ed., Ed. José Olympio

Sobre "Assim falou Zaratustra", Friedrich Nietzsche

Ainda não concebi esse tal "além homem", mas sei bem o que é "humano, demasiado humano". Devotada necessidade, vocação, intuitiva demanda de estudo para o filósofo.

De estilo poético e messiânico tal obra trouxe denso conteúdo para múltiplas interpretações, sendo redundante dizer que atravessarão os tempos como todo bem fundamentado jogo de verdades que a si bastam sem exigir provas (vulgo religião ou ideologia como preferir).

Obra impossível de estarrecimento único. Pede retorno e contraposições com o "Elogio da Loucura", "O ser e o nada" ou os quatro evangelhos (a provável maior fonte de inspiração para nosso autor Alemão).


Desfigurado, tive transplantado meu conceito de virtude, talvez deixando-o como enxerto nalgum canto do id que ainda me resta. Certos axiomas foram desmontados e novos descaminhos traçados rumo à almejada (e dardejada) real sabedoria (falácia?).

Ao viver por agora um momento fértil de ideias posso sentir postiço deslumbramento se ao menos puder ser o pavio úmido dessa dinamite no cerne de Gaia!