O medo e a morte das palavras

Palavras como preto, viado, leproso, aidético ou omoplata podem ser consideradas proibidas nos dias de hoje. No mínimo aqueles desavisados e despretensiosos que proferi-las sofrerão algum tipo de preconceito até justificar seu uso pelo contexto. Como diria a mãe de Caetano: - Venha ver o preto que você gosta.

As palavras dizem o que dizem e não podem fugir da face de dicionário, mesmo diante das suas mil faces ocultas.

As pessoas preferem mudar as palavras ou nomes como mecanismo de fuga do temeroso enfrentamento da semântica. Estigmatizar uma palavra, deixando-a no exílio empobrece a moral sob a ótica da fragilidade em formular conceitos e encaixar-se neles.

Sendo afro-descendente, negro ou preto não muda o fato de ser dotado de dosagens superiores de melanina e ter origens Africanas (diga-se de passagem, todos nós compartilhamos a mesma origem). Ser homossexual sem se considerar viado, baitola, boiola, etc, não muda o fato existencial. Pior seria negar a condição, deturpando sua existência ao procurar aparentar o que não é.

Diante das características de personalidade e caráter podemos revelar que um bom índice de maturidade seria rir de si mesmo, achar graça da graça dos outros. Daí poderíamos elevar o calão das palavras desmistificando-as: - Palavras são apenas palavras... ações são apenas ações! Dizem que em tempos remotos, os São Paulinos ao descerem a serra para a Vila Belmiro chamavam os torcedores do Santos de "peixeiros". E bradando os santistas repetiam: - Somos sim! Daí surgiu o mascote deste tradicional time de futebol (que lamentavelmente substituíram por um mamífero). Apenas quando não assumimos nossa real condição ficamos ofendidos quando somos chamados por sinônimos. A questão da identidade, do eu, ultrapassa a esfera dos rótulos.

Parte da consciência do existir e da dimensão do espaço que ocupamos. Torna-se um problema nos enxergar demasiadamente sobre o que acreditamos ser a óptica do outro. Ao conjecturar o que as dezenas de pessoas que convivemos pensam de nós terminamos por pensar menos o que somos com nosso próprio pensamento.

Podemos desfigurar a visão de nós mesmos, recaindo em predileções falsas, modismos ou mesmo no vazio pela falta de posição, opinião. Este vazio, cedo ou tarde, será revelado diante de impasses, cuja conduta certamente será considerada como incoerente, paradoxalmente veiculada ao fato de não haver objeto de contradição.

A ofensa somente existe em função do ofendido se deixar ofender. E... por favor... não se ofendam com as redundâncias nem o som de algumas palavras aqui empregadas.

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