Sangrando legitimidade

A velha história de que para falar de sangue devemos estar sangrando... De fato podemos questionar a legitimidade dos poetas que falam de amor sem submeter-se aos eflúvios deletérios e revigorantes deste negócio alcunhado sentimento.

Fazer poesia com o corpo pode soar como pecado para alguns, mas somos tão infensos à efusão lírica... Pode a consciência vagar pelo campo da realidade construindo-a a ponto de tornar genuína uma experiência não vivida? A ilusão comercializada alimenta nossos vorazes instintos imaterializados. Entulhamos pensamentos influenciados pelo grande irmão em prateleiras rachadas prontas a desmoronar na cabeça desbastada pela opinião deste onipresente ninguém.

Se para chegar mais longe precisamos escalar em ombros de gigantes, e se para chegar em algum lugar diferente precisamos trilhar caminhos por onde outros não foram, como atingir autonomia de pensar com os próprios pensamentos? E sentir o que sentimos? Sendo animais sociais, cujas influências advém dos contatos, não podemos autenticar algo como inovador senão como uma versão diferente do mesmo.

As variantes não são tão numerosas... É bem provável, então, que apenas o sentimento possa legitimar o ato. Sendo assim, devemos nos proibir o sonho, a insanidade, a improperiosa suja poesia da conquista vazia, da parede em casca, do frasco sem essência. Melhor não criar envólucros para a dor, tesão ou tédio. Melhor apenas desejar sem explicações. Melhor derivar, divagar por ladeiras úmidas e desprender a poesia do limbo das veias enquanto sorvemos o sangue da amada.

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