Sobre "O teorema de Fermat", Simon Singh


Um probleminha besta que qualquer criança de primeiro grau pode entender. Simples: não existe solução com números inteiros para a equação x^n+y^n=z^n, para n>2. Observe que se n=2 temos a famosa pitagórica soma dos quadrados dos catetos é igual ao quadrado da hipotenusa.

Prepotente, Fermat anunciara ter a resposta, porém advertiu não deixar para a posteridade por seu conteúdo não caber no rodapé de uma página. E uma brincadeira fez comichão em muitos pensadores. 

Atiçando vaidades, o tempo mostrou que não só da lógica pura e do conhecimento podem se vangloriar os matemáticos, pois a cobiça e a fama norteou muitos para a resolução deste insosso enigma.

Mas, afinal, existe abstração totalmente pura? Se nossos pensamentos advém do que captamos sensorialmente do mundo, não seria também de se esperar que nossa abstração matemática ainda se apegue a símbolos com alguma natureza concreta? Sendo assim, a matemática é também limitada e suas ampliações podem gerar provas que refutem outras, sobretudo ao variar-se o contexto. Um exemplo é o surgimento dos números irracionais, os quais não foram admitidos por se tratar de divisões imperfeitas, já que a natureza é perfeita. (ou Deus) Outro advento do absurdo foi o "zero". Não é possível trabalhar-se com a ausência, nem realizar uma divisão por nada. Hoje, podemos tratar o zero como infinitésimo e dizer que a divisão de um número por zero nos dará infinito. Mas e a dimensão do infinito? Podemos dizer que o conjunto dos números naturais tem um infinito maior do que o conjunto dos números primos. E os números complexos? Podemos calcular a raiz de dois negativo? Diante da limitação da nossa forma de expressarmos qualquer tipo de conhecimento avança quando alguém olha o problema de uma forma jamais dantes vista. 

Navegar é preciso. Expor-se ao ridículo ao trabalhar com ideias não ortodoxas é o preço pago pelos inovadores. Chegar ao limite de ingerir uma bactéria para provar sua sobrevivência no estômago, enclausurar-se sete anos para conciliar conjecturas das quais ninguém achara ser possível. Eis a beleza da ciência. Um único momento de êxtase que inunda toda uma vida. E saímos correndo nus exalando eureca!

Erigindo gloriosos obeliscos de conhecimento, o homem, que se orgulha em ser pensante, não pode deixar problemas sem solução. Paradoxalmente, a angústia insurge quando o homem não tem mais problemas de valia para resolver. A eterna insatisfação lapida a imanente necessidade da evolução submersa no conflito. Neste masoquismo, quanto mais complexo, mais instigante o problema se torna, porém, se insolúvel, logo ocorre o desinteresse. Assim, como uma boa mulher que deseja cativar seu amante, o problema deve mostrar-se tangível, mas sem deixar de ser intocável. Entreter dando pistas, carícias, mostrando o ombro, recolhendo-o, num ardiloso jogo que faz com que o seduzido se sinta próximo da realização de seu desejo, sem, contudo, completá-lo. Renovar as esperanças quando esta parece distante. Inebriar ardilosamente. Perfazer a espera de uma porta que ficara a vida toda a espera do único dono, deixando-o moribundo ao primeiro gesto da carcomida mão sobrerguida sobre a maçaneta.

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